sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Entrevista a Miguel Herlein (FC Goa)



Formado no Benfica, Miguel Herlein saiu do clube da Luz na mudança para o futebol sénior. Aos vinte e um anos e três temporadas volvidas, conta já com passagens por quatro clubes (Akritas Chiorakas, Granada, Vilaverdense e FC Goa) de quatro diferentes nações. A convite da Jovens Promessas, aceitou repassar a sua carreira e explicou como tem sido a experiência no futebol indiano. Confira o resultado:


Jovens Promessas – Em 2012, na transição para o futebol sénior, e após muitos anos de águia ao peito, colocou um ponto final na sua ligação ao Benfica. Sentiu alguma mágoa pela saída ou era um cenário para o qual já estava mentalizado? Não houve conversas no sentido de integrar a equipa B, que tinha acabado de ser criada?

Miguel Herlein – Foram oito anos e foi um prazer ser formado no meu clube de coração, onde aprendi e cresci muito. No último ano de júnior já estava um pouco mentalizado para a minha saída, porque não era utilizado. Tinha poucos minutos e sabia que um jogador que não joga no último ano de júnior muito dificilmente renova... Não houve qualquer conversação sobre a minha saída. 

JP – Seguiu-se o Akritas Chlorakas, da segunda divisão do Chipre. Quão evoluído é o futebol cipriota? Consegue apontar as suas principais características?

MH – Não foi a melhor decisão na minha carreira, mas acho que se aprende com os erros. Tinha saído de um clube muito grande e tinha algumas propostas em Portugal que talvez fossem melhores, mas quis arriscar e partir numa aventura para o Chipre. Não conhecia muito o futebol cipriota e acabou por ser uma má experiência. Joguei sempre até dezembro, mas de agosto a dezembro recebi apenas um mês de salário. Acabei por rescindir. 

JP – Meses depois, rumou à cidade espanhola de Granada, onde representou a formação secundária do clube local. No entanto, permaneceu pouco tempo na entidade castelhana. Por que razão se deu a saída? Quando assinou, a ideia não era chegar à primeira equipa?

MH – Sim. Apareceu-me a oportunidade de jogar no Granada, o que foi muito bom, pois tem muita qualidade. Subi de divisão e tinha uma proposta muito aliciante vinda de Portugal. Saí do Granada e a proposta de Portugal foi por água abaixo. Foi difícil de digerir, mas acho que nunca baixei os braços.

JP – Ao longo do último ano desportivo disputou o CNS, ao serviço do Vilaverdense. Vendo bem, nas suas três primeiras épocas como sénior atuou em quatro países diferentes. Sente que tantas influências, não só o tornaram numa pessoa mais madura, como moldaram o seu estilo de jogo?

MH – Nestes anos em que estive a jogar fora, noto bastante uma diferença. Não sei se é devido a nomes portugueses como Cristiano Ronaldo, Figo, Mourinho... Dão-nos mais valor fora do país, apostam mais em nós. Acho que com estas mudanças de país e ao viver diferentes culturas fiquei uma pessoa mais madura. Em relação ao estilo de jogo, sinto que estou a crescer, mas ainda tenho muito mais para viver e espero aprender muito mais, para cada ano ser um jogador mais completo. 

JP – Como surgiu a oportunidade de assinar pelo FC Goa? Por que motivos aceitou o convite?

MH – Esta oportunidade surgiu devido aos meus empresários, Vitor Gonçalves e Carlos Gonçalves, da Proeleven Gestão Desportiva, que me apresentaram este novo projecto. Aceitei-o devido aos nomes do futebol mundial que vinham para cá e, claro, em termos financeiros também é bom. Mas não é só isso. Acredito que, por eu ser jovem, pode abrir várias portas, pois todo o mundo está de olho nesta liga. Penso que jogar nesta liga indiana é uma oportunidade muito boa e estou a gostar bastante, apesar de estar muito longe do meu país.

JP – Na equipa indiana, é orientado por Zico e partilha balneário com Robert Pirès. O que é que já aprendeu com os dois?

MH – Não são todos os jogadores que têm um treinador como o Zico e um colega de equipa como o Robert Pirès, que já ganharam muita coisa no futebol e têm uma experiência que quase todos os jogadores gostariam de ter. Por isso, para mim é um orgulho. Já aprendi bastante com os dois. Tentam ao máximo ajudar. O que me ficou mais na cabeça até agora é que a pressa é inimiga da perfeição. Muitas vezes, o jogador quer fazer as coisas tão rápido que acaba por não ter tanto sucesso como teria se tivesse dado mais um toque na bola. Tenho comprovado que é verdade.

JP – Pirès, Ljungberg, Materazzi, Del Piero... Todos estes jogadores disputam a Indian Super League. Como classificaria a forma física dos ex-craques do futebol mundial que residem agora na Índia? Estão apenas a "arrastar-se" pelos campos, aumentando ainda assim as audiências, ou conseguem ter alguma intensidade e regularidade? 

MH – Penso que estiveram a treinar bastante antes de vir para aqui, porque estão em boa forma. Claro que não estão como quando jogavam ao mais alto nível, mas conseguem meter intensidade, porque muitas vezes não é o correr muito que faz a intensidade, mas sim fazer a bola andar rápido com passes ou combinações. É certo que muitos já têm uma certa idade, mas acho que a experiência os faz perceber aquilo que podem fazer e o que não podem. Por exemplo, o Elano [internacional brasileiro com passagens por Santos, Manchester City ou Galatasaray] é o melhor marcador da competição até agora, com 5 golos. 

JP – Como tem sido a sua adaptação ao país? Em termos, por exemplo, de alimentação, sentiu algumas dificuldades? Quais as principais diferenças no dia-a-dia?

MH – É verdade que no início foi um choque, pois pensava que a Índia fosse mais desenvolvida. Quando cheguei vi muita pobreza. Não há sinais de trânsito, é praticamente a lei do mais forte; quem se mete primeiro é quem passa. Mas acho que já me habituei. A comida é muito picante, por isso opto sempre por pratos internacionais. Nós vivemos num hotel, então não temos esse problema com a comida. Acho que as únicas diferenças são não estarmos com a nossa família e com os nossos amigos, porque de resto é igual. Descansamos e vamos treinar, porque os jogos são de três em três dias e também não temos folgas. Quando temos, aproveitamos para descansar. 

JP – Esta Indian Super League foi criada com o objetivo de aumentar o interesse pelo desporto-rei na segunda nação mais populosa do mundo, sendo que será disputada apenas entre os meses de outubro e dezembro. O que é que acontecerá depois a todos os atletas, e a si concretamente? Em janeiro abraçará novo projeto ou há a hipótese de permanecer na Índia?

MH – Sim, penso que o principal objectivo é fazer o futebol crescer na Índia, porque o desporto-rei aqui é o cricket. Acho que o interesse já aumentou. Se continuarem isto, poderá ser um mercado muito valioso, pois é um país muito grande. O meu contrato é de três meses. No final destes três meses sou um jogador livre. Em janeiro vou reunir com a Proeleven, para ver quais as opções e o que é melhor para mim. 

JP – Como imagina a sua carreira daqui a dez anos?

MH – Não penso muito no futuro. Penso mais no presente e no que posso fazer agora para ter sucesso no futuro. Mas não me importava de ter uma Bola de Ouro e jogar no Real Madrid... [risos] Estou a brincar. Penso que tenho que aproveitar cada momento e fazer o meu melhor agora, para que todos os anos possa ter cada vez mais sucesso.

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